Acabei de chegar do almoço. Parei na tabacaria habitual para comprar tabaco para o fim de semana e não pude deixar de reparar nos destaques das revistas... quase todas orientadas ainda para o trágico desaparecimento do pequeno Diogo, de 4 anos, sobrinho do mediático jogador Simão Sabrosa. Inevitavelmente vou acompanhado o assunto, já li a mesma história contada de diversas formas e algumas apontam para a falta de cuidado ou de demasiada tranquilidade demonstradas naquela tarde soalheira de Março. Mas enfim escrevo estas linhas, não para me focar ou apontar ou apurar a culpa... porque não vale a pena... o azar e o infortúnio bateu à porta de mais uma familia, como infelizmente acontece diariamente a tantas outras mas esta mereceu outro destaque e mesmo sem termos voto na matéria somos impelidos a acompanhar o seu desenvolvimento. Alguém ouviu mais alguma coisa do caso do bébé que morreu esquecido numa viatura em Aveiro?
Infelizmente tive um episódio na minha vida pessoal que queria partilhar e mostrar que às vezes não é por sermos irresponsáveis ou demasiado tranquilos ou permissivos que evitamos cometer erros... infortúnios irremediáveis!
Sempre que o tempo permite gosto de estender a minha tarde, após o trabalho, e aproveitar os últimos raios de sol numa esplanada. No ano passado cumpri este percurso religiosamente... ia buscar a Inês à escola por volta das 18h e lá iamos nós para o Parque Verde aqui em Coimbra. Ela ia para o parque infantil e eu ficava a vê-la da esplanada mesmo ao lado do parque. Num desses finais de tarde, encontrei-me lá com a Madrinha da Inês... já muito perto do final da tarde a Inês vem ter connosco à esplanada acompanhada de uma menina e da sua respectiva mamã!. Pediu-me se podia ir a correr até ali ao fundo... (aliás deixem-me situar-vos: temos uma esplanada, em frente desta temos o parque infantil e uns 10 metros depois do parque um urso gigante... e uns 20 metros para trás do urso está a ponte pedonal que liga as duas margens do rio... o nosso angulo de visão é por isso frontal até aqui... ficamos sem visibilidade a partir da ponde pedonal que se estende para a frente 100 metros até ao Pavilhão de Portugal, o último edíficio que se destaca deste parque, também conhecido como o espaço das "docas" )... é mais ou menos isto:
.... assumi que o ir até ali ao fundo fosse até ao urso, dar a volta a este e regressar... até porque lhe tinha dito que tinhamos que ir embora. A mãe da menina disse-me que iria a correr com elas... eu assenti com a cabeça e lá partiram felizes pelo percurso traçado.
Como mãe atenta que sou... vi a Inês a correr... por momentos perdi-a do meu radar de visão, dado ter passado por trás do Urso... dei mais ao menos aqueles segundos e aguardei o regresso... não passaram mais que 2 minutos e dou o alerta à Madrinha da Inês que já tinham tido tempo de dar a volta para trás... Ficámos ali uns segundos a pensar que possivelmente tinham ido mesmo até junto da entrada da ponte pedonal e dai a demora no regresso pelo qual os nossos olhos tanto ansiavam... Nada!
Por impulso levantei-me, preocupada mas ainda com alguma calma e comecei a andar na direcção que elas tinham seguido... passei o parque infantil, passei o urso, passei a ponte pedonal, olhei em frente e apercebi-me que não via a minha filha, aliás não se via viv'alma! Fiquei aflita! Entrei em pânico... só pensava está ali mesmo a entrada para o parque de estacionamento... já a meteram num carro... perdi a minha filha.... e pior é que eu permiti.... que tinha acabdo de consentir que tal me estivesse acontecer! Quanto mais andava, mais aflita e impotente me sentia... cheguei a pensar que mal conseguia identificar aquela mulher, aquela outra criança... apenas na memória tinha o facto da menina usar uma t-shirt da Assoc. Acreditar... nada mais! A Madrinha da Inês a meu pedido voltou para trás, podia-se ter dado algum desencontro e seria importante que alguém permanecesse na esplanada. Andei muitos e muitos metros como louca, com o coração em pânico, nem sei neste momento descrever o que senti naqueles minutos... acho que os piores minutos de toda a minha vida! Respirei de alivio quando ao longe vejo 2 crianças a brincar com uma senhora... não foi preciso muito para reconhecer a minha filha. Na altura não demonstrei áquela mulher o pânico em que segundos antes tinha tomado o meu corpo, a minha cabeça, o meu coração, mas apenas umas semanas depois. Hoje encontramo-nos regularmente, jantamos quase todas as semanas juntos, partilhamos momentos mágicos nos nossos lares.... mas tudo poderia ter sido tão diferente! Meu Deus como neste momento podia fazer parte de mais uma familia destroçada... não quero nem imaginar!
Isto para vos dizer que não sou uma pessoa irresponsável, ou pouco atenta ou demasiado relaxada... mas por fracções de segundos não medi qualquer consequência, não vi mal algum em ter dado o OK GO à minha filha... ainda hoje sinto um misto de remorso, de raiva pelo meu acto irreflectido e impotência no sentido de não ter calculado esse risco! No risco em que insensatamente coloquei a vida da minha filha!
Olhando para trás posso hoje esboçar um sorriso de tranquilidade. Agradecer ao meu anjinho da guarda e tirar deste triste episódio uma grande lição de vida!
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